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Placar na Justiça sobre PIS/Cofins de receitas financeiras está empatado
17/01/2023
Pelo menos 25 contribuintes já recorreram ao Judiciário para tentar obter o direito de recolher, por 90 dias, PIS e Cofins sobre receitas financeiras com alíquotas reduzidas – de 2,33% no total. O balanço é da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que aponta a existência de apenas duas decisões: uma favorável e outra desfavorável ao contribuinte.
A redução tinha sido instituída pelo Decreto nº 11.322, assinado pelo então presidente em exercício da República, Hamilton Mourão. O texto foi publicado no dia 30 de dezembro, penúltimo dia do governo Bolsonaro.
O impacto da medida foi calculado em R$ 5,8 bilhões. Mourão baixou a alíquota do PIS de 0,65% para 0,33%. Da Cofins, de 4% para 2%. A justificativa era de liberar recursos para que empresas no sistema não cumulativo pudessem “expandir suas operações, investir e criar novos empregos”.
No dia 2 deste mês, porém, a norma foi revogada por novo decreto, de nº 11.374. A medida foi assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e restabeleceu as alíquotas originais de PIS e Cofins.
Com a alteração, contribuintes começaram a recorrer ao Judiciário. Alegam que essa elevação das alíquotas das contribuições sociais só poderia entrar em vigor após 90 dias da publicação do decreto – ou seja, cumprir a chamada “noventena” -, conforme jurisprudência já consolidada no Supremo Tribunal Federal (STF).
Porém, nos processos, a PGFN alega que, apesar de existir essa jurisprudência, não poderia ser aplicada a esse caso, por ser totalmente atípico. Para o órgão, como as mudanças foram rápidas, não teriam chegado a gerar efeitos práticos aos contribuintes. O decreto que reduziu as alíquotas foi publicado na sexta-feira, dia 30 dezembro, e no artigo 2º, diz que entraria em vigor em 1º de janeiro, um domingo. Contudo, foi revogado no próximo dia útil, dia 2, segunda-feira.
Ao analisar um desses processos, no fim da semana passada, o juiz José Tarcísio Januário, da 1ª Vara Federal de Jundiaí (SP), afirmou não verificar a inconstitucionalidade ou a ilegalidade alegada pelo contribuinte.
De acordo com a decisão, o artigo 150, inciso I, da Constituição Federal prevê que é vedado exigir ou aumentar tributo sem que lei estabeleça. E o artigo 97, inciso II, do Código Tributário Nacional (CTN) exige leis tanto para a majoração de tributos como para redução. Assim, entendeu que esses decretos tratam-se de norma com eficácia limitada.
Nesse sentido, cita uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de 2003, que analisou a possibilidade de complementação de norma de eficácia limitada por norma posterior do Executivo, em um caso que também tratava de PIS e Cofins (REsp 518473). Segundo a decisão “as normas de eficácia limitada são de aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, porque somente incidem sobre esses interesses após uma normatividade ulterior que lhes desenvolva a eficácia”.
Para o magistrado, o Decreto nº 11.374, de 2023, “não apresenta ilegalidade ou inconstitucionalidade, por se tratar de normatividade posterior de benefício tributário concedido em norma de eficácia limitada pendente de posterior regulamentação”, diz na decisão.
Já sobre a possibilidade de aplicação da chamada anterioridade nonagesimal, o juiz afirma que “temos que a revogação da norma que diminui a alíquota das contribuições não é considerada, pela jurisprudência do STF, como majoração, e, assim não se submete à anterioridade, uma vez que se trata de tributo já existente” (mandado de segurança nº 5000027-16.2023.4.03.6128)
De acordo com o advogado que entrou com os dois pedidos de liminares já analisados, Rafael Goulart, sócio do Abreu, Goulart & Santos Advogados, a decisão que negou o pleito da empresa contraria toda a orientação consolidada pelo Supremo e que, por ter sido analisada em repercussão geral, seria vinculante. (Tema 278 ou RE 568503, de 2014).
Nesse julgamento, os ministros do STF analisaram o restabelecimento, pelo Decreto nº 8.426 de 2015, dos percentuais de PIS e Cofins, após um período de alíquota zero. E decidiram que a alteração deveria respeitar o prazo de 90 dias.
A tendência, segundo Goulart, é que o Judiciário mantenha esse mesmo entendimento na situação atual. “É um direito dos contribuintes que está materializado. Não daria para entrar na discussão se essa alteração foi surpresa ou não porque entraria numa discussão muito subjetiva.”
O advogado Rubens Souza, do W Faria, concorda. “Esse ponto da legalidade já foi superado pelo STF desde aquele decreto da Dilma [Rousseff] que restabeleceu as alíquotas [nº 8426 de 2015]”, diz. Para a parte sobre a anterioridade nonagesimal, a decisão reservou apenas um parágrafo, que tentou dizer que no caso não se aplicaria. “Isso não tem fundamento porque qualquer alteração, até mesmo por decreto, que vá aumentar a carga tributária precisa sim observar a anterioridade nonagesimal para PIS e Cofins.”
Em Porto Alegre, porém, o juiz Evandro Ubiratan Paiva Silveira, da 13ª Vara Federal, decidiu de forma favorável ao contribuinte. Ele afirma, na decisão, que deve ser observado, no caso, o princípio da anterioridade nonagesimal (90 dias), já confirmado em outras situações semelhantes pelo STF. Ele cita, no texto, a ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 5277 e o Tema 278 da repercussão geral (RE 568503), de 2014.
O magistrado ainda destaca, na decisão, que estaria presente o perigo da demora, “considerando que a exigência de recolhimento a maior de tributos impõe um ônus financeiro exagerado ao impetrante, sendo certo, ainda, que o provimento ora deferido não é irreversível, podendo a cobrança ser restabelecida a qualquer momento, sem prejuízo à existência do crédito fiscal” (mandado de segurança nº 5000422-72.2023.4.04.7100). O período de 90 dias é contado da data de publicação do Decreto nº 11.374/23.