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Fique de olho: Ipiranga confirma que Conecta é projeto-piloto; Departamento Cível/Comercial alerta para o que chama de “canto da sereia”
22/02/2022
Desde novembro, o projeto Minaspetro Pós-pandemia, criado para capacitar a Revenda a lidar com o chamado “novo normal”, tem aproximado a direção do Sindicato e os recém-criados núcleos de Bandeirados e de Marca Própria. E tem sido fórum de questões muito relevantes, como ocorreu na reunião on-line com revendedores Ipiranga: o presidente do Sindicato, Carlos Guimarães, foi informado sobre a oferta de um novo serviço pela distribuidora, o Conecta. Vários revendedores relataram desconfiança sobre a novidade.
Segundo informações repassadas pelos empresários, trata-se de uma plataforma que utiliza inteligência artificial para, a princípio, auxiliá-los na precificação dos combustíveis. Ocorre que, para se beneficiar do Conecta, é preciso que o revendedor permita o acesso da Ipiranga a dados como estoque e volume de vendas e a informações de clientes que abasteceram nos postos. A princípio, as exigências causaram estranheza ao presidente do Minaspetro, sobretudo porque a distribuidora se nega a compartilhar com a Revenda os dados dos clientes do Abastece Aí – programa de descontos implementado há cerca de quatro anos pela empresa.
“A grande questão, a meu ver, é que dados são o ‘novo petróleo’. E a Ipiranga já se deu conta disso. A companhia vem com um modismo tecnológico e todo o mundo cai nesse ‘canto da sereia’, que parece não se tratar de uma verticalização, mas é, já que impõe a presença de um intermediário entre o consumidor final e o posto”, alerta o coordenador do Departamento Jurídico Cível/Criminal do Minaspetro, Arthur Villamil. Vale ressaltar que o modelo de operação direta entre distribuidora e consumidor final é proibido pela Resolução 41/2013 da ANP. “Ela veta expressamente a verticalização. As distribuidoras não podem operar a Revenda. No entanto, temos visto um crescimento acentuado dessa visão no mercado”, adverte.
Villamil acrescenta que, em junho de 2021, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) analisou a plataforma Conecta. A relatora, conselheira Paula Azevedo, argumentou, à época, que a proposta de política apresentada pela empresa “não desperta preocupações concorrenciais porque reúne elementos que afastam a possibilidade de gerar efeitos anticompetitivos no mercado”. Arthur Villamil discorda. “Trata-se de um problema concorrencial, sim. O Cade autorizou, mas, mais cedo ou mais tarde, acho muito pouco provável que não tenhamos um imbróglio relacionado a isso”, afirma.
Contudo, por causa do caráter inovador da plataforma e o uso de nova tecnologia no setor, o Cade estabeleceu que o prazo de vinculação da resposta do órgão à consulta da Ipiranga vale por dois anos.
Sem revendedor
Para o advogado do Minaspetro, o “embrião” do Conecta é justamente o Abastece Aí. “O programa está funcionando a pleno vapor há vários anos. É uma máquina de coletar dados para poder orientar programas de venda ou até mesmo de precificação e não os compartilha com a Revenda. É só mudar a cláusula do contrato”, observa Villamil. Para ele, a intenção da Ipiranga é criar uma plataforma maior para integrar dados dos clientes finais e de faturamento dos postos e até preços de combustíveis de cada um para propor, por exemplo, que um revendedor possa reduzir em R$ 0,03 ou aumentar em R$ 0,02 o preço dos combustíveis sob o argumento de ser tornar mais competitivo. O objetivo final, segundo ele, vai além: “No futuro, não sei quão distante, isso pode facilitar, inclusive, a eliminação da figura do revendedor”, alerta.
Diante disso, a direção do Minaspetro orienta que, inicialmente, os revendedores não compartilhem dados relacionados à gestão dos postos com a plataforma Conecta. “Do ponto de vista legal e jurídico, o revendedor é livre para escolher se quer aderir ou não a uma parceria dessa natureza. Mas é preciso ter muita atenção, pois, ao fornecer os dados solicitados, o posto pode ficar numa posição fragilizada”, pontua o advogado.
É preciso, segundo Villamil, ter um contrato detalhado, que deve ser submetido à análise do Jurídico Cível/Comercial do Minaspetro. O segundo ponto é que o revendedor deve ter ciência de que estará fornecendo dados estratégicos de seu negócio para uma companhia que pode, eventualmente, usá-los de maneira não conveniente ao posto de combustíveis.
O que diz a distribuidora
A Ipiranga foi procurada pela Revista Minaspetro e vários questionamentos ficaram sem resposta, como, por exemplo, a respeito dos benefícios que o revendedor teria ao se cadastrar. “O Conecta é uma plataforma de serviços que integra os revendedores, franqueados e parceiros Ipiranga em um ecossistema digital único. Trata-se de um projeto em fase piloto e em expansão, e mais informações serão divulgadas no momento oportuno. É importante esclarecer que o ecossistema de dados da Ipiranga só tem acesso aos principais dados, previamente autorizados por revendedores e franqueados”, diz trecho da nota enviada à publicação.
Com relação às críticas do não compartilhamento de dados do Abastece aí com a Revenda, a distribuidora respondeu: “é essencial lembrar que o compartilhamento de dados para terceiros sem autorização é proibido por lei. Cabe à Ipiranga respeitar a privacidade de seus clientes, o que é de total compreensão e conhecimento de todos os parceiros.”