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Projeto de combustível verde divide setor privado e deve mudar no Senado

21/03/2024

Fonte: Valor Economico

Alvo de disputa entre o governo e a Petrobras, o projeto de lei que estimula a descarbonização dos combustíveis também divide o setor privado. Enquanto os grandes consumidores de energia, especialmente a indústria, criticam possíveis aumentos de custos, setores do agronegócio comemoram a ampliação de seus mercados. No meio do caminho está a cadeia de produção e distribuição de combustíveis.

Todos os insatisfeitos, principalmente a Petrobras, vão intensificar as articulações para que o texto, aprovado com folga na Câmara dos Deputados, seja alterado no Senado. Segundo o Valor apurou, a tendência é de que os senadores façam mudanças, especialmente relacionadas às metas para mistura de biodiesel no diesel e à obrigatoriedade de compra de biometano pela indústria do gás natural.

Escolhido para relatar o projeto, o vice-presidente do Senado, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), disse que não iria comentar pontos específicos porque ainda está analisando a matéria. A indicação dele foi considerada uma vitória política do presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, que não está satisfeito com a versão aprovada pelos deputados em acordo com o Palácio do Planalto.

“Este projeto tem a importante missão de contribuir para a transição energética de baixo carbono de forma segura, auxiliando para que o país possa cumprir os acordos internacionais de meio ambiente e ganhe cada vez mais protagonismo na agenda energética internacional”, limitou-se a dizer o relator.

Um dos pontos mais controversos é a obrigatoriedade de compra de biometano pelos produtores e importadores de gás natural. De acordo com o texto, eles terão que incluir pelo menos 1% de biometano no volume total comercializado a partir de 2026. O biometano é obtido a partir da purificação do biogás, uma mistura de gases que têm como origem o processo natural de decomposição de resíduos orgânicos.

Diretor de Gás Natural da Abrace, associação que reúne os grandes consumidores de energia, Adrianno Lorenzon diz que a medida representa “um tiro no pé” de um setor que vinha se desenvolvendo gradativamente. Na sua avaliação, as indústrias devem ter liberdade para escolher a melhor estratégia de reduzir suas emissões e não serem obrigadas a adotar um determinado caminho.

“Com o mercado de créditos de carbono, por exemplo, você escolhe o movimento. Aqui está sendo enfiada goela abaixo uma solução. É um tiro no pé do próprio mercado de biometano”, afirmou o dirigente, ao lembrar que o custo do gás natural, que já está elevado, pode subir ainda mais, inviabilizando algumas operações.

Na ponta oposta, a Associação Brasileira do Biogás (Abiogás) entende que a obrigatoriedade é importante para garantir a universalização e a interiorização do combustível no país. Alessandro Gardemann, presidente do conselho da entidade, lembra que os produtores e importadores poderão comprar certificados que correspondem à cota de biometano prevista no projeto de lei, o que vai facilitar o cumprimento da meta.

Sobre o aumento dos custos, ele prevê que, após um primeiro momento, haverá um salto na demanda pelo combustível biológico, o que acabará acomodando os preços. “Metanol verde, amônia verde, aço verde, tudo isso vai ser feito com biometano. Esses produtos vão precisar deste selo para acessar o mercado europeu, por exemplo”, projetou o dirigente. “A hora de criar esse mercado é agora”, completou.

Não é o que pensa a indústria química, uma das principais consumidoras de gás do país. Em nota, a Abiquim expressou “preocupação em relação às imposições contidas” no projeto do Combustível do Futuro. De acordo com a entidade, alguns pontos críticos, sobretudo a exigência do biometano, “podem afetar adversamente o setor industrial”.

Cálculos da Abiquim apontam para um custo adicional de pelo menos R$ 171 milhões para o cumprimento do mandato de 1% do biometano. Se a meta chegar aos 10% previstos no projeto de lei, o montante subiria para R$ 1,71 bilhão. “O setor já enfrenta desafios consideráveis, incluindo altos custos de produção e competitividade internacional”, alegou o presidente da associação, André Passos Cordeiro.

Entre os importadores de combustíveis, o projeto foi visto como positivo, mas passível de aprimoramentos. O presidente da Abicom, Sérgio Araújo, disse que a definição de percentuais mínimos para a mistura de biodiesel dá previsibilidade ao mercado, o que é bom. Ele ressalta, no entanto, a importância de que isso não estimule uma “reserva de mercado” para os atuais produtores.

“Se o objetivo maior é redução da emissão, que seja de qualquer rota tecnológica, qualquer origem, inclusive com a possibilidade de importação do biodiesel”, afirmou ele, ao lembrar que, hoje, a importação é vedada pela legislação. “A reserva de mercado é extremamente danosa para a sociedade”, completou o dirigente.

Principal distribuidora do país, a Vibra (ex-BR Distribuidora) também está preocupada com uma possível reserva de mercado para os biocombustíveis e o seu efeito sobre os preços. Vice-presidente de Relações Institucionais da empresa, Henry Hadid teme que o aumento da mistura de biocombustíveis em combustíveis fósseis, previsto no projeto, abra espaço para mais adulteração.

Por isso, uma das demandas da Vibra é para que a mistura seja feita diretamente pelos produtores de combustíveis, e não mais pelos distribuidores. O executivo também defende um “mandato único” para a mistura, ou seja, que todos os tipos de biocombustíveis certificados possam ser misturados. Ele citou, por exemplo, a inclusão do diesel coprocessado no mandato do biodiesel, um dos principais pleitos da Petrobras.

 

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