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Risco de gargalo? Com alta nas vendas de carro elétrico, montadoras agem para evitar falta de peças

12/08/2024

Fonte: O Globo

As vendas de veículos eletrificados cresceram quase 150% no primeiro semestre deste ano, em relação ao mesmo período de 2023, indicando o interesse crescente do brasileiro pela inovação. Mas o consumidor que pensa em trocar o carro a combustão principalmente pelo elétrico puro tem preocupações que impedem um crescimento ainda maior desse mercado.

Uma pesquisa feita pela consultoria Roland Berger no Brasil mostra que a oferta de peças e componentes agora aparece ao lado das barreiras já conhecidas: falta de infraestrutura de carregamento e alto preço de revenda dos veículos, já que a maior parte é importada.

Diante dessa percepção, as montadoras que planejam fabricar carros elétricos no país correm para calibrar estoques de componentes para tentar evitar que clientes esperem muito tempo em caso de reparo, como nos relatos que têm aparecido em redes sociais e sites de queixas de consumidores.

— Atualmente, tudo é importado, e a falta de peças é uma das três principais preocupações do brasileiro em relação aos elétricos. Ninguém quer ficar dois ou três meses com o carro parado esperando manutenção — diz Cristiano Doria, sócio da Roland Berger responsável pelo estudo, que ouviu 800 pessoas em junho.

No levantamento, os entrevistados demonstraram preocupação com o fornecimento e reparo de baterias, motores e inversores (componentes que convertem a corrente contínua do sistema elétrico do veículo em corrente alternada, alimentando a bateria). O estudo mostrou que 46% dos entrevistados acreditam que apenas em cinco anos o país poderá produzir a maioria das peças. E 32% avaliam que isso só acontecerá em dez anos.

Vendas de veículos elétricos disparam, mas obstáculos limitam expansão desse mercado — Foto: Editoria de Arte/O Globo

Vendas de veículos elétricos disparam, mas obstáculos limitam expansão desse mercado — Foto: Editoria de Arte/O Globo

Armazenamento

 

O GLOBO consultou várias concessionárias das duas principais marcas de veículos elétricos no país, as chinesas BYD e GWM, sobre a disponibilidade de peças. A informação é que se não houver o componente no estoque, o prazo para a chegada fica entre dez e quinze dias.

As duas marcas planejam começar sua produção nacional de veículos entre este ano e 2025, com fábricas na Bahia e em São Paulo. Elas informaram que já iniciaram conversas com fornecedores locais para garantir a oferta de peças e reduzir custos.

 

A BYD, que teve crescimento acelerado de vendas oferecendo por aqui o Dolphin a partir de R$ 149 mil e já está entre as dez marcas que mais vendem no país, enfrentou falta de peças no início do ano, segundo consumidores relataram nas redes sociais.

De acordo com a montadora, os pedidos diários de componentes das concessionárias subiram de 200 para 600 em um prazo muito curto por causa da alta nas vendas e do número de veículos eletrificados em circulação no país, que já alcançou o patamar de 300 mil.

A empresa investe no reforço do estoque de seu centro de distribuição no Espírito Santo, que tem 375 mil itens, além da logística de distribuição, e afirma ter solucionado esse gargalo. Mas já tem planos de duplicar o tamanho desse centro.

Com vendas mais fortes no Sudeste, a GWM montou um centro de armazenagem de peças, em Cajamar, na Grande São Paulo. Trata-se de uma opção logística, já que o centro fica perto de aeroportos como Viracopos e Guarulhos e do Porto de Santos, além de rodovias importantes, como a Bandeirantes. A maioria das peças vem da China. O investimento no estoque foi de R$ 45 milhões, e corresponde a 560 mil itens, o que garante suprir a demanda de seis meses.

— Decidimos não poupar esforços para compor o estoque das concessionárias. Hoje, elas têm de para-choques a portas e para-lamas. Se não tiverem, fazem o pedido e, em 24 a 48 horas, recebem — afirma Thiago Potenza, diretor de Logística da GWM.

O prazo pode ser maior para as regiões mais distantes. Em Manaus, por exemplo, a entrega pode levar sete dias, diz o executivo. Se for um pedido urgente, a empresa manda a peça de avião em até quatro dias, mas toda essa eficiência em logística se reflete no preço do serviço final ao consumidor.

O corretor de imóveis Fabio Ribeiro, de São Paulo, optou pela compra de um veículo híbrido em vez do elétrico puro justamente por causa da preocupação com falta de peças. Mas sua experiência ainda assim não foi boa. Após uma pequena batida de sua BMW 330e, ano 2021, a bateria elétrica teve um dos módulos avariados, impedindo o uso do carro mesmo a combustão.

Como a garantia já estava vencida, a troca da peça foi orçada pela marca em R$ 150 mil, mais da metade do valor do carro, que é de R$ 250 mil. Ribeiro recorreu a uma oficina especializada em elétricos e híbridos de São Paulo para tentar recuperar a bateria por menos, mas mesmo assim acabou gastando R$ 60 mil no reparo.

— Foi preciso importar peças, e todo o processo levou seis meses, tempo em que fiquei com o carro parado — diz.

Custo alto

 

O preço elevado das peças preocupa motoristas e é um fator que tem levado donos de elétricos ao centro automotivo K2, em São Paulo, que tem unidade especializada nesses veículos. Segundo Igor Fatel, coordenador administrativo da empresa, entre os elétricos mais novos, a maior procura é por recuperação de itens como portas ou para-lamas:

— Também temos recebido mais clientes com problemas na bateria ou danos por colisões, que buscam um serviço mais rápido e mais em conta.

Ricardo Bastos, presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), que representa o setor, afirma que o consumidor brasileiro é exigente. Por isso, tem recomendado às montadoras que estão vindo para o país que estejam bem preparadas não só no estoque de peças, mas também no atendimento pós-venda.

Ele observa que algumas fabricantes estão oferecendo garantia de 5 a 8 anos nas baterias. Com o início da produção de elétricos puros no país, o dirigente acredita que vai se formar uma cadeia de fornecimento local de peças, baixando o custo de frete na importação, além de reduzir o impacto do câmbio. Bastos diz que as empresas desejam montar baterias no Brasil, ainda que com componentes importados.

— Há preocupação do consumidor não só com disponibilidade das peças, mas também pelo preço desses componentes, já que são veículos com alta tecnologia. Isso pode ser o diferencial de sucesso de uma marca no Brasil — diz o líder da ABVE, ressaltando no entanto que a manutenção de um elétrico pode ser mais barata que a de um carro a combustão porque há menos componentes e não há troca de óleo, pastilha ou disco de freio.

Daniel Conte, diretor de Pós-Venda da GWM, avalia que ainda há um estigma no Brasil em relação às primeiras marcas chinesas que chegaram ao país, há cerca de 15 anos, quando de fato consumidores sofreram com escassez de peças.

Ele lembra que essas marcas vieram por meio de grandes distribuidores, sem previsão de produzir no país. Agora, a abordagem é diferente, com o pós-venda como pilar da estratégia para cair no gosto do brasileiro, diz:

— No pós-venda, é preciso ter bom preço. Precisa saber fazer os reparos e ter bom atendimento. Queremos desmistificar esse estigma do passado com as marcas chinesas.

O Minaspetro divulga notícias de outros veículos como mera prestação de serviço. Esses conteúdos não refletem necessariamente o posicionamento do Sindicato.