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Em alta, carros elétricos pressionam rede de energia e desafiam construtoras
01/09/2025
Fonte:Diário do Comércio
O Estado já é um dos principais mercados no Brasil, mas ainda necessita de adaptações para atender essa crescente demanda por infraestrutura voltada para a eletromobilidade
O crescimento no número de carros elétricos e híbridos em Minas Gerais tem ampliado a demanda por pontos de recarga e, consequentemente, por energia. Empresas dos setores energético e imobiliário têm buscado soluções para evitar sobrecarga e outros problemas na rede. Além disso, a ausência de regulamentação é apontada como um dos principais desafios da eletromobilidade.
Um levantamento da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE) mostra que Minas registrou 13.933 veículos vendidos nos sete primeiros meses de 2025. O volume supera tanto o mesmo período de 2024 (5.711) quanto o recorde de todo o ano passado, quando foram comercializados 10.883 carros do tipo.
Até fevereiro deste ano, Minas contabilizava 1.154 eletropostos em operação — sendo 940 em corrente alternada (recarga lenta) e 214 em corrente contínua (recarga rápida). O Estado ocupa a quarta posição nacional, atrás apenas de São Paulo (4.468), Rio de Janeiro (1.398) e Rio Grande do Sul (1.159).
Segundo o gestor de inovação em eletromobilidade da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), Franz de Cassias Strobel, o segmento apresenta aumento na demanda por potência e energia elétrica devido ao agrupamento de cargas em condomínios, garagens e hubs de recarga. Ele acrescenta que o transporte público também pressiona ainda mais a necessidade de potência na rede.
Toda essa demanda por energia exige uma infraestrutura mais robusta de distribuição. O especialista ressalta que, antes dos equipamentos de recarga, é preciso garantir o fornecimento de energia elétrica.
Strobel destaca o plano de investimentos da Cemig para 2025 a 2029, estimado em R$ 39,2 bilhões, dos quais R$ 23,2 bilhões serão destinados à área de distribuição. “A Cemig entende que toda transição energética requer infraestrutura e investimento robusto em rede de distribuição”, afirma.
A consolidação de uma infraestrutura de distribuição robusta possibilita que diferentes empresas ampliem a oferta de carregadores elétricos no mercado. O gestor acrescenta que a Cemig estuda lançar ações voltadas para a expansão dessa infraestrutura.
Atualmente, a empresa atua com iniciativas como o programa Cemig Mob, que concede descontos de até 20% na tarifa de energia para proprietários de veículos elétricos ou híbridos plug-in.
Barreiras para o avanço da eletromobilidade em Minas
A coordenadora de novos projetos da Somattos Engenharia, Bruna Pereira, afirma que um dos principais desafios das construtoras é definir corretamente o dimensionamento da rede elétrica nos imóveis. O custo inicial de infraestrutura para instalar pontos de recarga também é apontado como barreira.
Ela ressalta, porém, que a instalação de carregadores valoriza os imóveis no mercado, e a Somattos tem instalado câmaras transformadoras para suprir a demanda extra de energia nos condomínios. “A demanda gera um custo elevado, mas que é compensado pelo ganho de atratividade do imóvel”, afirma.
Para a professora de Engenharia Elétrica do Centro Universitário FEI, Michele Rodrigues, a capacidade instalada da infraestrutura dos edifícios é a principal barreira a ser superada. Muitos prédios residenciais foram projetados sem considerar cargas adicionais, o que pode causar sobrecarga em transformadores e outros equipamentos.
O primeiro vice-presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil em Minas Gerais (Sinduscon-MG) Bruno Magalhães, ressalta que a infraestrutura interna dos imóveis não é o único ponto a ser considerado. Para ele, é necessário que toda a cidade esteja preparada para receber a nova frota de carros elétricos e híbridos.
O especialista observa que muitos municípios ainda têm pouca infraestrutura para atender à nova demanda. “Algumas cidades não possuem pontos públicos de recarga elétrica nem postos de gasolina adaptados”, afirma.
Ele cita como exemplo o trajeto entre Belo Horizonte e Rio de Janeiro (RJ), marcado por intenso fluxo de veículos, mas com poucos pontos disponíveis para recarga de carros eletrificados.
Já Strobel avalia que o grande desafio para o avanço da eletromobilidade em Minas é a extensão territorial do Estado, que implica uma rede de distribuição igualmente ampla da Cemig. Segundo ele, é fundamental definir com exatidão para onde os recursos previstos no plano de investimentos devem ser direcionados.
“O desafio é alinhar o cronograma de obras em andamento aos locais que receberão projetos mais expressivos de eletromobilidade”, explica.
De acordo com dados da ABVE, três cidades mineiras (Belo Horizonte, Uberlândia e Juiz de Fora) se destacam tanto no número de emplacamentos quanto na quantidade de eletropostos. Juntas, somam 10.971 carros vendidos entre janeiro e julho deste ano, o equivalente a 78,8% do total. Essas cidades concentram ainda 339 pontos de recarga, correspondendo a 29,38% do total em Minas Gerais.
O especialista ressalta a necessidade de que os interessados em desenvolver projetos de eletromobilidade comuniquem a Cemig com antecedência, evitando que o fornecimento de energia seja deixado para o final. Esse aviso prévio contribui para o cronograma de obras da empresa e reduz o tempo necessário para a conclusão do projeto.
Apesar das dificuldades, Bruna Pereira acredita que Minas vem se preparando nos últimos cinco anos para atender à crescente demanda por energia elétrica. Segundo ela, as tratativas com órgãos responsáveis, como a Cemig, têm se tornado mais ágeis recentemente.
“Eles também percebem que essa é uma fonte de energia sustentável, de baixa emissão de carbono, e que tende a se popularizar. Vejo que todos estão em busca desse tipo de solução”, afirma.
A importância da regulamentação
Segundo a professora da FEI, a regulação do segmento tem acompanhado o ritmo de expansão, com alguns projetos de lei em tramitação, como o PL 158/2025. A proposta assegura o direito de o condômino instalar ponto de recarga individual, desde que sejam observadas as normas técnicas aplicáveis (NBR 17019, NBR 5410, IEC 61851/62196).
“A tendência é que municípios e estados passem a exigir infraestrutura mínima de eletromobilidade em novos empreendimentos imobiliários, incluindo previsão de shafts, espaços para quadros dedicados e infraestrutura para gestão de demanda”, projeta.
Essa evolução normativa, segundo Michele Rodrigues, deve impulsionar uma padronização cada vez mais rígida no setor. Ela acredita que esse cenário também trará maior segurança jurídica para moradores, síndicos e construtoras.
Entretanto, a ausência de regulamentação sobre a instalação de carregadores para carros elétricos segue como um dos grandes desafios do mercado imobiliário. Flávia Vieira, vice-presidente da Câmara do Mercado Imobiliário e do Sindicato da Habitação de Minas Gerais (CMI/Secovi-MG), ressalta a necessidade de aprovação do PL 158/25.
“Sem essa regulamentação, ficamos sem parâmetros para avançar, o que dificulta a realização de investimentos. O projeto de lei é fundamental para que o mercado consiga responder a essa demanda”, afirma.
Ela acrescenta que a legislação também poderá beneficiar projetos de adaptação em imóveis mais antigos. Entretanto, ressalta que, por terem um número menor de vagas de garagem, esses empreendimentos — especialmente os que passaram por retrofit — tendem a apresentar menor demanda por pontos de carregamento.
