O braço financeiro do PCC comandado em São Paulo construiu um centro de distribuição de combustíveis adulterados em uma estrada entre os municípios de Teresina e Altos (PI), aponta a Polícia Civil do Piauí. Segundo a corporação, o local iria abastecer uma rede de 49 postos do grupo nos estados do Piauí, Maranhão e Tocantins.
O esquema foi descoberto pela Polícia Civil do Piauí, que deflagrou hoje a Operação Carbono Oculto 86, que reúne quatro inquéritos para investigar lavagem de dinheiro e organização criminosa, além de crimes ao consumidor e ao fisco.
As imagens feitas pela polícia mostram a área do centro erguido, que estava prestes a entrar em funcionamento. Ele possui um tanque gigante com capacidade para armazenar 1,08 milhão de litros.
Para iniciar a fraude no Piauí, eles compraram uma rede de postos de combustíveis em dezembro de 2023 que atuava nos três estados. A partir daí eles passaram a adulterar o combustível vendido, que era comercializado em quantidade fraudada, a chamada bomba baixa (quando o consumidor paga, mas leva menos que a litragem marcada na bomba).
“Um posto de gasolina movimenta milhões de metros cúbicos, e o grupo precisa comprar combustível e misturar com álcool ou nafta. Onde fazer a mistura? Não iam fazer em um balde, tem que ter uma estrutura de distribuição. E eles estavam montando essa estrutura justamente para permitir que houvesse o fornecimento de combustível adulterado”, explica Anchieta Nery, diretor de inteligência da SSP (Secretaria de Segurança Pública) .
Ainda em 2023, sem saber da relação com o PCC, a polícia tomou conhecimento das fraudes ao consumidor ao apreender oito caminhões com solventes no município de Lagoa do Piauí.
“Inicialmente eles faziam essa adulteração em um dos postos; mas com o avanço e as novas empresas, eles sentiram a necessidade de um espaço maior, e por isso adquiriram essa área para fazer uma distribuidora”, explica o delegado Laércio Evangelista, da coordenação do Draco (Departamento de Repressão às Ações Criminosas Organizadas).
Rede comprada em 2023
Segundo a polícia, o PCC comprou uma rede de postos de empresários piauienses em dezembro de 2023 para entrar no ramo de venda de combustíveis adulterados. O grupo estava em expansão, com aquisição de novas empresas e montando novos postos.
Após o compartilhamento de dados da operação Carbono Oculto, em São Paulo, as autoridades piauienses perceberam que os postos que estavam sendo investigados nesse processo de adulteração tinham relação com os suspeitos ligados ao PCC.
O elo então se fechou: essa rede de postos foi adquirida em nome de uma empresa de fachada recém-criada em São Paulo ligada à facção. A operação de hoje fechou 31 postos somente no Piauí, alguns deles que já tinham mais 20 autuações por irregularidades dos órgãos de fiscalização.
Segundo a polícia, para mascarar os verdadeiros donos, os chefes do esquema criavam fundos de investimento e holdings. Havia então, em seguida, o uso de fintechs e contas interligadas para repassar o dinheiro.
Ao longo desses dois anos de investigação, a polícia identificou repasses do PCC ao Piauí de R$ 348 milhões —valor que consta na decisão judicial para bloqueio dos suspeitos.
O poder econômico dos empresários que se apresentam como donos de postos espantou as autoridades. “Eles tinham uma vida nababesca, com quatro aeronaves —uma foi apreendida, e as outras três a gente está fazendo a localização”, diz o secretário de Segurança Pública do Piauí, Francisco Lucas.
Para esconder o esquema e sonegar impostos, havia postos que chegavam a ter três CNPJs diferentes, um deles separado para comprar solventes sem chamar a atenção. Segundo a investigação, o esquema envolvia mais de 70 empresas relacionadas direta ou indiretamente.
“O que a gente percebeu é que o Piauí era um lugar logisticamente estratégico, por ser a única capital do Nordeste fora do litoral e que se conectava fácil com Maranhão e Tocantins. Então aqui estava sendo usado como um centro de distribuição, e eles achavam que aqui haveria uma menor fiscalização”, diz.
Ele explica ainda que a rede de combustíveis ligada ao PCC estava causando um grande prejuízo aos postos que atuavam legalmente nesses estados.
Eles pressionavam outros postos sufocando os empresários honestos por preços baixos. Aí, aquela pessoa que tem um, dois postos tinha de baixar o preço. Eles expandiram canibalizando outros postos.Francisco Lucas
O secretário ainda explica que o esquema operacionalizado usava o dinheiro sujo do PCC para alimentar o dinheiro limpo. “E aí começa a ter uma confusão patrimonial”. É a primeira vez, e é bom que se diga, que a gente tem os recursos do do Sudeste vindo alimentar a organização criminosa, a lavagem, aqui no Nordeste. Então há uma dissociação entre a criminalidade violenta –aquele PCC que está nas ruas– que não está conectado com esse grupo. Esse grupo é alimentado pelo braço financeiro do PCC de São Paulo, que estava lá, instalado na Faria Lima, e que financiou essa operação aqui no Piauí.Francisco Lucas
